domingo, 20 de janeiro de 2013

O Protagonismo da Juventude no semi-árido: a experiência do Coletivo Regional do Cariri, Seridó e Curimataú(PB)


Atualmente, muitos jovens enfrentam desafios para permanecer no meio rural. O grande desejo de ter uma vida melhor e estável incentiva muitos a deixarem suas origens. No entanto, a migração geralmente tem sido uma alternativa frustrada para a sobrevivência de jovens que saem de suas comunidades.

Essa realidade vem mudando a partir da revalorização do potencial da juventude camponesa na área de atuação do Coletivo Regional do Cariri, Seridó e Curimataú paraibano (ou apenas Coletivo), entidade que articula organizações de agricultores e agricultoras familiares camponeses presentes nessas regiões em defesa da agricultura familiar sustentável e segundo o princípio da convivência com o semiárido.

Este artigo se propõe a mostrar como os jovens se inserem na consolidação do território de abrangência do Coletivo, envolvendo-se nas mais variadas atividades com a consciência de que estão colaborando para o futuro da região. Essa, digamos, missão lhes dá estímulo e melhora sua autoestima, uma vez que passam a vislumbrar possibilidades concretas para levar uma vida digna ao praticarem uma agricultura em bases agroecológicas.

O contexto socioambiental

O desenvolvimento rural sustentável no semiárido constitui um enorme desafio pelas características naturais e sociais da região. A primeira questão que apontamos, já bem conhecida, está ligada às secas, que se caracterizam não apenas pela limitada pluviometria, mas sobretudo por sua irregularidade.

Mesmo nessas condições, a agricultura familiar continua sendo a atividade geradora de trabalho e renda para boa parte da população rural ativa. É no semiárido que se encontra o maior número de estabelecimentos agrícolas familiares do Brasil. Entretanto, a estrutura fundiária é extremamente concentrada: 42% do número total de unidades familiares do país ocupam apenas 4,2% do total da área agrícola (Censo Agropecuário 1995/96). Para completar o quadro, as elites agrárias detêm as maiores cotas de poder, gerando dependência econômica e política das famílias pobres em relação ao acesso à terra, à água e à segurança e soberania alimentar.

Essa situação é particularmente desafiante no território do Cariri, Seridó e Curimataú paraibano. As condições edafoclimáticas são as mais extremas, a estrutura agrária está entre as mais concentradas e as organizações de produtores caracterizam-se por sua fragilidade e vulnerabilidade frente às estruturas do poder público municipal. Muitas famílias dependem ainda dos grandes proprietários para terem oportunidades de trabalho e favores diversos.

O Coletivo Regional do Cariri, Seridó e Curimataú paraibano

O protagonismo da juventude se dá com muita força no Coletivo, organização cuja origem remonta aos anos 1980, quando as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tiveram forte atuação na região. Seu foco era a evangelização, mas além da fé abarcava as dimensões da política e da ação sociotransformadora.

Esse dinamismo foi acompanhado por segmentos progressistas da Igreja Católica, dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs) e de ONGs que organizaram grupos de evangelização, bancos de sementes comunitários, mutirões para construção e melhoria de reservatórios de água, etc. Essas ações foram se expandindo para comunidades rurais de vários municípios. Mesmo com a desarticulação das CEBs, a ação não parou. Segmentos da Igreja Católica local, o STR de Soledade e ONGs, como o Patac e a Pracasa, continuaram desenvolvendo atividades voltadas para melhorar a qualidade de vida dos camponeses, principalmente por meio da construção (ou melhoria) de equipamentos de armazenamento de água de chuva, a exemplo das cisternas de placas, da criação de Fundos Rotativos Solidários (FRSs) e de Bancos de Sementes Comunitários (BSCs).

Conforme as iniciativas de convivência com o semiárido se irradiavam, foi se configurando, no município de Soledade, um espaço de gestão participativa denominado Coletivo Municipal de Educação Solidária de Soledade e Entorno. Formado em 1998 por agricultores experimentadores e lideranças, sua primeira ação coletiva foi a gestão de recursos dos FRS.

Esse espaço de gestão participativa se ampliou à medida que comunidades rurais e famílias agricultoras assessoradas pelo Patac realizavam atividades de intercâmbio de experiências e de conhecimentos. Em 2004, essa rede se fortaleceu com o aumento da experimentação agroecológica orientada para valorizar as riquezas locais. Suas iniciativas foram sendo cada vez mais reconhecidas, tais como a disseminação de práticas de conservação e o uso dos recursos naturais (com ênfase no resgate e na valorização das sementes locais, assim como na produção e estocagem de forragem diversificada); captação da água de chuva e uso sustentável das águas para consumo humano e produção vegetal e animal; uso e conservação da biodiversidade local. São práticas até hoje fundamentais e estratégicas para a permanência das famílias e para o enfrentamento dos períodos de estiagem prolongada, mas, sobretudo,são formas de resistência e luta em defesa da cultura e do modo de vida camponês no semiárido.

É desse movimento de resistência e luta que foi se constituindo a identidade do Coletivo. Em alguns anos se agregaram progressivamente associações comunitárias, STRs, igrejas e entidades de apoio de aproximadamente 300 comunidades rurais de dez municípios do semiárido paraibano. Consolida-se, assim, um grupo para defender um projeto político e técnico que fortaleça redes locais de inovações agroecológica, contrapondo-se ao modelo que separa a agricultura da natureza.

O Coletivo também atua junto à Articulação do Semiárido Paraibano (ASA Paraíba), à Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil) e à Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), o que permite que as famílias participem de debates e ações num nível muito mais amplo. Esse processo de organização é marcado pela participação e interatividade dos jovens de várias comunidades rurais.

Fonte: Revista Agriculturas; Experiência em Agroecologia. Março 2011, vol. 8 nº 1.

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